Alimentação à base de plantas: #1 proteína

Diz um estudo realizado em 2018 que a proteína é, talvez, o maior entrave para algumas pessoas aderirem a uma alimentação à base de plantas.

Estou a brincar, que seja do meu conhecimento, não há estudos sobre isso, mas é uma dúvida frequente e que me é colocada muitas vezes:

Onde vou buscar proteína se não como carne, peixe, ovos, leite e derivados?

 

Não vou mentir, é mais difícil atingir as nossas necessidades proteicas seguindo uma alimentação à base de plantas.

Aliás, um artigo de revisão realizado em 1996 por Messina e Messina¹ (agora é mesmo a sério), concluiu que os veganos consumiam apenas entre 10 a 12% de valor energético total proveniente de proteína, enquanto que os ovolactovegetarianos consumiam entre 12 a 14% e os omnívoros entre 14 a 18%.

Claro que este estudo é antigo e pode estar desatualizado. Prova disso é que em 2003 a American Dietetic Association e a Dietitians of Canada afirmaram que as dietas ovolactovegetarianas, e mesmo as veganas, conseguiam atingir (e em alguns casos exceder) as necessidades proteicas.

Mas, e este é um grande MAS, mais do que a quantidade de proteína, importa a sua qualidade!

Infelizmente, a proteína vegetal não é de tão boa qualidade como a proteína animal, e isso deve-se a três fatores, essencialmente:

  1. Teor em aminoácidos essenciais
  2. Digestibilidade
  3. Fatores antinutricionais

Aminoácidos essenciais

São os aminoácidos que o nossos corpo não consegue produzir endogenamente e que, por isso, têm que ser obtidos através da alimentação.

As proteínas vegetais contêm todos esses aminoácidos, mas um mais mais poderão estar presentes numa quantidade muito reduzida – são os aminoácidos limitantes.

No caso dos cereais integrais, por exemplo, os aminoácidos limitantes são a lisina e a treonina, enquanto que nas leguminosas são a metionina e a cisteína.

Se juntarmos os cereais integrais com as leguminosas acabamos por obter todos os aminoácidos essenciais, e é por isso que antigamente se falava de complementaridade proteica, onde se sugeria o seu consumo na mesma refeição.

Hoje em dia já parece ser mais importante consumir uma ampla variedade de alimentos ricos em proteína vegetal ao longo do dia, e não necessariamente na mesma refeição. Ou seja, não precisam de comer arroz com feijão de manhã à noite (embora eu não me importasse, sobretudo se fosse com tomate)!

Dentro dos aminoácidos essenciais, importa ainda referir os aminoácidos de cadeia ramificada (BCAAs), com especial destaque para a leucina, que atua como gatilho na síntese proteica muscular.

A fim de consumir todos os aminoácidos essenciais (incluindo BCAAs na porção 2:1:1 de leucina, isoleucina e valina), na quantidade necessária, no momento pós-treino (especialmente importante para atletas de alta competição e não frequentadores de ginásio ocasionais), pode ser interessante recorrer a proteínas vegetais isoladas, como a de soja, que é a única proteína vegetal de qualidade semelhante às animais. Existe também uma mistura de proteínas com um aminograma igualmente completo, como a de arroz integral com ervilha e cânhamo.

 

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Digestibilidade

A digestibilidade das proteínas vegetais é inferior à das proteínas animais. Estamos a falar de valores na ordem dos 85% vs. 95%, sendo que nalguns alimentos, como o millet integral e o feijão, essa digestibilidade é ainda mais reduzida, podendo variar entre os 50% e os 80%.

Esta característica das proteínas vegetais deve-se, essencialmente, à parede celular das células vegetais. Uma vez removida essa parede, como acontece nas proteínas isoladas ou no glúten de trigo, a digestibilidade assemelha-se à das proteínas animais, ultrapassando os 90%.

Para além da parede celular vegetal, o processamento dos alimentos e fatores antinutricionais naturalmente presentes nos alimentos, também reduzem a sua digestibilidade. É o caso da fibra de vários alimentos de origem vegetal, os fitatos dos cereais integrais, os taninos dos cereais e das leguminosas, e os inibidores de tripsina e hemaglutaninas das leguminosas.

A boa notícia é que esses fatores antinutricionais podem ser eliminados através de algumas estratégias:

  • Demolhar
  • Germinar
  • Cozinhar em panela de pressão

 

O mais típico é fazermos isto apenas com as leguminosas, mas estes são métodos que podemos aplicar também nos cereais integrais e nos frutos secos, por exemplo.

 

Fontes de proteína

Não vos vou falar da quantidade de proteína que devem ingerir porque isso depende MUITO da pessoa, dos seus objetivos, e até dos seus gostos e rotina.

No entanto, deixo-vos aqui uma imagem para terem noção do que comer para ter uma ingestão proteica adequada:

Fontes de proteína vegetal, por 100g

A soja e derivados são excelentes fontes de proteína, mas há-que ter cuidado com a sua origem! Deve garantir-se que são de origem biológica e, portanto, sem organismos geneticamente modificados.

O seitan também é uma boa fonte de proteína, mas menos interessante a nível de outros micronutrientes.

As sementes e os frutos secos fornecem bons níveis de proteína, mas convém não esquecer que trazem consigo muita gordura (ainda que seja saudável) e calorias.

Por outro lado, as leguminosas são a fonte proteica vegetal mais usual, mas isso acarreta também uma ingestão elevada de hidratos de carbono.

Como ao longo do dia convém ainda ingerir cereais integrais e/ou pseudo-cereais (quinoa, amaranto, trigo sarraceno) para conseguirmos obter todos os aminoácidos essenciais, temos que pensar muito bem na nossa alimentação para não ficar nenhum macronutriente em défice ou excesso.

Como podem conseguir isso?

Procurando a ajuda de um/a nutricionista que estabeleça os vossos objetivos a nível de calorias e macronutrientes e vos diga onde ir buscar cada um deles, sem colocar em risco a ingestão adequada de micronutrientes!

Podem também registar tudo o que comem no site Cronometer. Para mim foi extremamente útil fazer isso nos primeiros tempos, para ter uma noção se estava a conseguir atingir as minhas necessidades, sobretudo a nível de proteína e micronutrientes.

Outro conselho que vos dou é “não tentem ser perfeitos/as”É muito difícil fazer uma alimentação impecável todos os dias. Um dia vão conseguir obter todo o selénio que precisam, mas se calhar no dia a seguir, como já não incluíram nozes, o selénio vai estar em défice. E não tem problema! Não têm que comer nozes todos os santos dias.

É importante haver um equilíbrio e, sobretudo, fazer uma alimentação intuitiva, com a qual se sintam bem.

 

Ainda com receio?

Posso dizer-vos que, em duas semanas de pré-época,  ganhei massa magra e perdi massa gorda. Foi do treino? Foi da alimentação? Não sei, mas foi com certeza uma sinergia entre os dois!

 

No próximo “episódio” de alimentação à base de vegetais falarei sobre os minerais. Wait for it 😉

Beijinhos,

Laranja-lima

 

Bibliografia

  1. Messina M, Messina V. Vegetarian diets for athletes. In: Messina M, Messina V, editors. The dietitian’s guide to vegetarian diets: issues and applications. Gaithersburg (MD): Aspen Publishers, 1996: 124-35, 354-67
  2. SILVA, Sandra Cristina et al. Linhas de orientação para uma alimentação vegetariana saudável. Lisboa: Direção-Geral da Saúde, 2015. ISBN 978-972-675-228-8
  3. VENDERLEY, Angela; CAMPBELL, Wayne. Vegetarian DietsNutritional Considerations for Athletes. Sports Medicine. 2006. 36 (4): 293-305
  4. ROGERSON, David. Vegan diets: practical advice for athletes and exercisers. Journal of the International Society of Sports Nutrition. 2017. 14 (36)

3 comentários a “Alimentação à base de plantas: #1 proteína”

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